O percurso e a luta da minha vida

Eu, Carl Friedrich Wilhelm Butzke estou em casa do meu filho Franz em Cedro na margem esquerda. Minha memória ainda é lúcida. Hoje em setembro do ano de 1940 conto com 97 anos e 5 meses. Meus braços e as pernas já estão fracas. O que toca ao peito ainda estou me sentindo bem, a comida me apetece.

NA ALEMANHA

Meus amados pais eram trabalhadores rurais em Wusterbarth debaixo do arrendador Villnow. Eu nasci em Wusterbarth, comarca de Belgard, Pomerânia em 20 de abril de 1843. De 6 a 14 anos frequentei a escola, meu mestre era o professor Jahn. Fui confirmado pelo Pastor Tischler. De 17 a 20 anos trabalhei como criado-mor com quatro cavalos. Com 20 anos me apresentei para a inspeção militar. Passei como são e prestável e fui incorporado como infantarista ao 6º regimento de infantaria da Pomerânia N.° 49, 1° exército pomerano. Em 1.° de setembro de 1863 tive que apresentar-me em Schivelbein. Pommersch Stargard ficou o meu quartel. Aí fui adestrado e instruído no serviço militar. Na Rússia houve grande revolução, os poloneses pretendiam separar-se da Rússia.

Na Prússia ocidental havia muitos poloneses que se ajuntaram para socorrer aos poloneses da Rússia. O príncipe Bismarck deu ordem, comandou o 2.° exército pomerano e mandou cerrar tôda a fronteira com a Rússia. Nenhum polonês podia atravessar mais a fronteira. Por isso a Polónia perdeu a revolução. Em dezembro de 1864 novamente houve paz. Os poloneses tiveram que sujeitar-se e ficar com a Rússia. Como o nosso regimento mostrou-se valente, recebeu o quartel Gnesen na fronteira da Prússia ocidental com a Rússia.

Em 1865 houve uma grande manobra na região de Bromberg até Nakel. Comandante era o estimado príncipe herdeiro Friedrich. Em 1866 houve guerra entre a Prússia e a Áustria. Todo o exército da Prússia foi mobilizado. Em marchas forçadas entramos em terra inimiga. Os prussianos lutaram com valentia. Vitória após vitória foi conquistada. Os austríacos tiveram que ceder. A batalha decisiva travou-se em Königgrätz no dia 3 de julho. Pelo meio dia a batalha estava indecisa, mas enfim os prussianos venceram. Na batalha tombou o nosso coronel von Wietersheim. Em marchas forçadas o inimigo foi perseguido e em breve os prussianos estavam a 3 milhas de Viena. Aí o Imperador da Áustria fêz as pazes com a Prússia. Na cidade de Nikolsburg foi assinado o tratado. Repentinamente irrompeu a peste, milhares morreram. Então os prussianos voltaram às suas guarnições pátrias.

Eu tinha então servido 3 anos, tive que ficar, porém, por causa da guerra mais quatro meses. Assim que ao todo servi ativamente 3 anos e 4 meses. Durante o meu tempo não recebi castigo, meu comportamento era bom. Em 22 de dezembro de 1866 dei baixa. Em 23 de dezembro às 3 horas da madrugada cheguei na minha aldeia natal, Wusterbarth. A alegria dos meus amados pais foi grande. O arrendador Villnow logo me deu serviço como cocheiro. Conduzi a carruagem até que emigrei.

NO BRASIL

Da nossa aldeia já havia conhecidos em Blumenau. Êles tinham escrito que aqui por pouco dinheiro se conseguia 100 “morgen” de terra com mata virgem. Estas cartas me atraíram. No dia 6 de abril com mais 6 famílias deixei a Alemanha. Era no ano de 1869. Meu primeiro matrimônio eu tinha contraído com Friederike Kannenberg no dia 15 de novembro de 1867 na igreja de Wusterbarth, Pastor Tischler nos deu a bênção. Em Hamburgo fomos embarcados num veleiro. O nome do navio era Humboldt e o nome do capitão era Plump. No mês de junho chegamos ao pôrto que antigamente se chamava Barra. Por meio de canoa fomos levados a terra. De Blumenau até Indaial a nossa mudança foi levada por carroça. Em Indaial fui informado que em Cedro havia terra boa. Dietlein Krambeck levou o meu baú até na colônia. Escolhi o n.° 20. Aí edifiquei um rancho com palmitos, aonde morei três anos. Não me agradei do lote e como o n.° 17 ainda estava desocupado mudei para lá e hoje ainda estou nêle.

Na Alemanha passei por fadigas e penas. Êste começo na mata porém para mim e para os outros colonos foi o mais penoso. Os víveres eram escassos, muitas vêzes passamos fome. Também tivemos que estar dia e noite alerta. Os bugres selvagens nos circundavam. Também o tigre nos visitou que em tôda colónia fêz muitos estragos. Numa noite de chuva forte o tigre me abateu uma rês de três anos, arrancando-lhe os nervos da goela. Também dois bons cachorros êle me comeu.

Já havia crianças na idade escolar. Johann Lemke convocou uma reunião. Fundamos a escola. Eu, Ferdinand Zumach e Carl Jahnke fomos eleitos à diretoria. Trabalhamos em turmas. Quando a madeira estava pronta, o carpinteiro Lahsan a armou. Assim foi erguida a escola. Os bancos escolares foram feitos por Julius Vogel e Carl Bewiahn. O primeiro professor foi Julius Scheidemantel. Êste, durante anos, lecionou na escola. Era um professor justo e honesto. Êle descansa no cemitério em Timbó. Nosso amado Deus o tenha como salvo.

Nova reunião foi marcada para combinarmos a construção da igreja. Eu fui eleito primeiro presidente. Junto com August Klug e Friedrich Klug eu a edifiquei. Derrubamos a madeira em nosso mato. O carpinteiro Gustmann armou e levantou a madeira. O serviço de pedreiro foi feito pelo pedreiro Froehlich. A igreja é a que hoje temos. Os bancos da igreja foram feitos por Julius Vogel e Carl Bewiahn. Também trabalhei como feitor de D. Blumenau, na construção de estradas. Também como quarteirão estive em exercício mais de vinte anos.

Em Cedro no dia 21 de março de 1875 minha amada espósa, esperando um bebe, veiu a falecer. Aqui no mato nêste tempo não havia recurso. Nem carroças não existiam. Friedrich Donner levou a defunta por canoa pelo rio Cedro até Timbó. Ela descansa em Timbó no cemitério. Ela me deixou três filhos fortes que ainda estão vivos e casados.

Cinco mêses eu era viuvo. No dia 29 de agósto de 1875 contraí o meu segundo matrimónio com Auguste Lemke. Para casar fomos à cavalo até Badenfurt. Na igreja de Badenfurt recebemos a bênção pelo Pastor Hesse. Meu segundo matrimónio foi feliz. Festejamos juntos as bodas de prata, de ouro e de diamante. Minha segunda esposa faleceu em 28 de agosto de 1938. Ela alcançou a idade de 88 anos. Criamos em nosso matrimónio 7 filhos, 4 rapazes fortes e 3 meninas. Estão todos com saúde e casados. É para mim motivo de grande alegria ter criado dez filhos sãos, que ainda vivem todos. Também tenho mais de 70 netos e 100 bisnetos mais ou menos. Nosso amado Senhor e Deus os abençoe com saúde e contentamento. Minha estadia tenho com o meu filho Franz. Nada me falta aqui e estou passando bem. À pedido de meus filhos escrevo este protocolo, o percurso, a luta e o trabalho da minha vida.

Em 1869 cheguei à Blumenau. Então o Brasil ainda era monarquia. Fomos bem recebidos e apoiados. Também os funcionários em Blumenau eram bons: Dr. Blumenau, H. Wendenburg, Reinhold Freygang.

Viva o Brasil.

O que Deus faz, bem feito está, justa é a sua vontade. Quem em Deus confia, não será enganado.

Amém!

Post scriptum:

Wilhelm Butzke sen. faleceu em 2 5 de agosto de 1941 na avançada idade de 98 anos, 4 meses e 5 dias após breve doença. Seus sobreviventes são 10 filhos, 70 netos e 143 bisnetos e também um bis-bisnetinho. Êle foi sepultado no cemitério de Timbó no dia 26 de agosto com grande acompanhamento. Texto da prédica: Salmo 91, 1. 2. 7. 14—16.

trad. Pastor Harald Roepke.

O texto acima, é uma transcrição do mesmo publicado no livro Unsere Väter – Nossos Pais publicado sob os auspícios do Sínodo Evangélico de Santa Catarina e Paraná pelo Pastor Max-Heinrich Flos. O livro completo, em formato PDF, poderá ser obtido neste link.

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